8.6.07

Apenas um elefante sem sequer ter nome

Já os dias tinham recomeçado e voltado a desaparecer e, fosse a luz tão clara que quase os cegava, fosse noite escura já sem lua, continuavam lá no alto, agora sempre em fila cansada, quase exausta, olhos postos no da frente que via um qualquer horizonte que aos outros lhes parecia sempre o mesmo: um mar que nunca mais acabava. Esse, o da frente, ia tentando animar que sim, que era só mais um dia, dois, já faltava pouco, que alternativa lhe restava? Nenhuma, só o esconder a dúvida, apresentar certezas absolutas e a manada seguia em fila.

Lá em baixo desfilavam ilhas, pouco mais que pedras, nada que servisse de paragem e eles voavam lá em cima, sobre calhaus plantados na água, um barco por vezes, um marinheiro que olhava para o céu e esfregava os olhos, as nuvens a pregarem partidas em forma de elefantes.

É nestes cenários, também nestes, em que o céu parece estar cheio de elefantes voadores em direcção a parte incerta, em que os marinheiros contam histórias nas quais ninguém acredita, em que todas as ilhas são apenas de rocha parda, que aparecem as coisas mais extraordinárias: esta surgiu lá em baixo, no meio de um dia de vários azuis, um verde a destacar-se, um ponto que foi aumentando até tomar a forma de uma costa cheia de árvores e de rios, uma miniatura de ilha onde na verdade os arbustos eram contados com os dedos de uma mão e os riachos nem isso. Mas as perspectivas e as expectativas enganam e aquele pedaço de terra, por momentos, pareceu-lhes o paraíso, o oásis que se deseja desesperadamente.

Os elefantes pararam no ar. Pairaram, melhor dizendo, em círculos sobre a ilha; sempre em fila. Consultaram-se uns aos outros em silêncio e o da frente ia começar um movimento com a cabeça, as orelhas um pouco murchas; mas não conseguiu. O tempo requerido para abanar uma cabeça de elefante é demasiado longo comparado com o tempo que outro elefante demora a sair da fila e a picar sobre a ilha.

Lamento. Lamento mesmo muito, eu, o autor já quase de lágrimas nos olhos, os elefantes em estado de choque: todos nós sabemos o que vai acontecer. Todos nós olhamos para baixo e vemos um elefante feliz, a voar alegremente, orelhas estendidas de antecipação, a tromba esticada para mais depressa tocar nas folhas, para se encher de água, de descanso, de finalmente repouso. Voa cada vez mais depressa sem olhar para trás. Não pode ver a fila de elefantes que voa o mais depressa possível, sabendo todos eles que, mesmo à velocidade máxima, será sempre tarde demais, aquele leva já um avanço fatal.

São assim as coisas e acontecem em segundos. Os segundos que demoram o mais feliz dos elefantes a colocar quatro patas em terra, desatar a correr como um doido e, finalmente, olhar para cima. Sobre ele paira uma fila de elefantes que voam em círculo. Espanta-se que não aterrem. Chama-os aos gritos, venham venham! de que estão à espera? e os elefantes desatam a chorar. E não há coisa mais triste no mundo agora, este onde chovem lágrimas de elefantes sobre um elefante ainda intrigado, parado, sobre uma ilha paradisíaca, uma ilha pequena no meio do mar, uma miniatura de ilha onde não há sequer uma pista para aterrar.

Nem para levantar.

6.6.07

péra lá!

lembrei-me de outra melhor: epá que grande chatice, então vim agora aqui de propósito responder a todos os amáveis comentos que me deixaram e não é que o haloscan está outra vez offline??? Vai ter que ficar para depois, beijos e abraços e lenços a acenar para todos!

eu nem tou cá!

(vou fazer de conta que não consegui ainda ver aqui o tasco, para não ter que responder agora aos comentos, estou cansada e não me apetece e amanhã posso fazer isso com mais calma)

4.6.07

Ainda os elefantes voadores

Já lá vão, talvez sobre a ponta de Sagres, imagine-se que aterraram entretanto numa praia, num bosque ao lado; que deitaram umas árvores abaixo, comeram umas toneladas de folhas e esvaziaram uns rios (vamos imaginar que não estariam poluídos para efeitos literários) para que as forças não faltassem no caminho. Que ali da Fortaleza os tenham visto passar, todos trocados e fora da linha em subidas e voos picados na ventania. Já não são uns elefantes meio baralhados com os semáforos e os faróis dos carros, é madrugada e são elefantes felizes, a caminho de qualquer lado. O que um elefante precisa (não os outros mas estes, que precisam de tudo aquilo que quem os descreve achará que precisam) é de uma bússola, um rumo, de uma estrela polar ou de outra qualquer, até pode ser das que mudam de sítio; mas um elefante tem que saber orientar-se e as placas das estradas, convenhamos, vamos ali e já voltamos. Quando um gajo um elefante está a modos que perdido (nada disto tem a ver com uma certa segunda circular feita direitinha nas calmas, atenção!, não precisa de grande coisa, sinceramente. Um elefante está perdido como toda a gente fica perdida, engana-se e pensa que se perdeu em vez de continuar a andar até chegar a qualquer lado. Um gajo (ok um elefante) nunca se perde na realidade; basta qualquer coisa, até uma placa errada e vai dar a algum lado. Pode não ser o lado que se pretendia, mas é um lado, certo? É o que interessa, um lado.

- mas qual lado???
- tazai...
- não vamos começar.
- ok, também tenho sono.
- já viste bem o que escreveste?
- não, nem por isso...
- um lado, é o que interessa, um lado qualquer???
- ahn...
- isso era só para encher não era?
- era, por acaso, era...
- então não era um lado qualquer, pois não?
- er, não...
- era um lado específico.
- é sempre um lado específico...
- achas bem dar essas tangas aos leitores?
- eles não se importam...
- mas podem achar que é mesmo assim!
- não acham nada, são pessoas inteligentes...
- e os elefantes estão aí a fazer o quê?
- pareceu-me bem...
- como eram grandes enchiam muito espaço, tou mesmo a ver!
- hum.
- a ver se escreves sobre formigas...
- não me chateies.
- pois pois
- ...
- amua sempre, viram?

3.6.07

bzzzzzzzzzzzzzzz,01



sim, eu sei, não é a segunda circular, mas acham mesmo que eles iam lá ficar o resto da noite?!

bzzzzzzzzzzzz

Tenho os elefantes a voar sobre a segunda circular. Tentei transformá-los em pássaros de longas asas, em voos elegantes, circulares também, talvez até umas torres envidraçadas, mas não tive qualquer hipótese; os elefantes prosseguiram como se nada fosse, como se não notassem o esforço da mão que carrega no delete. Elefantes, pensei eu, enquanto iam passando muito sérios, quando decidem qualquer coisa, incluindo serem alados sobre uma estrada de três ou quatro faixas, não há quem os demova. Deixei-os para trás, ainda a vê-los no espelho retrovisor, trombas esticadas e corpos em balão a pairarem agora, sempre em fila muito certa a uns dez metros do chão.

Ok, digo eu, eles não estavam realmente lá. Mas continuam e eu não percebo porquê que ficaram a pairar. Um pouco como as lâmpadas dos candeeiros, aquelas que se acendem no momento exacto em que estamos a passar. Coisas que calham e cujo sentido tentamos encontrar de qualquer forma, porque raio se acende aquele candeeiro naquele preciso segundo, porque diabo tenho eu os elefantes a pairar quase ao lado de uma daquelas pontes de atravessar. A única coisa que sei é que são meus, estes elefantes, só meus, pela simples razão de os ter escrito, de os transpor para a realidade. Mas não sei se gostam, se ficam felizes; se é alguma coisa que um elefante que consegue voar queira, ser transformado em letrinhas.
Suspeito que não.

 
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